Quando você conversa com pessoas bem mais velhas, percebe que elas têm um modo de pensar diferente do seu, não é? O mesmo acontece quando você tem informações sobre como vivem pessoas que nasceram e moram em países distantes, com costumes diversos dos nossos. Essas diferenças dependem da cultura, isto é, o conjunto de formas de dizer, pensar e sentir de uma pessoa ou de uma sociedade.
Guarde duas idéias importantes:
1. A cultura muda no decorrer do tempo e depende do lugar: é uma construção social e histórica;
2. A língua é um dos elementos que expressam fortemente a cultura e que contribuem para transformá-la.
Portanto, sociedade, cultura e língua interferem continuamente uma na outra. Você vai ler um texto, publicado pouco antes do novo Código Civil, que é um exemplo do que afirmamos.
Sabe o que é o Código Civil? É um conjunto de leis que se referem às pessoas e às atividades essenciais que fazem parte da sociedade humana. O Código Civil inclui todas as normas consagradas ao longo do tempo, podendo, no entanto, modificá-las para se adequarem à mudança dos costumes e às necessidades sociais. O Código Civil seria uma espécie de “Constituição do Homem Comum”
Agora, leia o texto.
O Código Civil de 1916, que entrou em vigor no dia 1º de janeiro de 1917, privilegiou claramente o masculino, como era uso ao seu tempo. O pai era o chefe da sociedade conjugal, a mulher casada era relativamente incapaz, a gerência e a administração dos bens eram do marido e havia longuíssima enumeração dos requisitos do dote, constituído pela noiva, por seus pais ou por estranhos, a ser administrado exclusivamente pelo marido. O dote poderia compreender todos os bens da noiva na data do casamento e os que ela, no futuro, viesse a adquirir. (...)
Algumas discriminações foram desaparecendo ao longo do tempo, como aconteceu com a chefia absoluta da sociedade conjugal, extinta em 1962. As discriminações sociais resistiram muito para desaparecer. A mulher preferia suportar os defeitos do esposo a deixá-lo, pois era ela quem quase sempre pagava pelo peso social de ser, como se dizia, “largada do marido”.
O preconceito, porém, não terminava aí. A palavra homem foi tomada na lei brasileira durante grande parte do século 20 como significando a pessoa titular de direitos, enfim, o ser humano. A rigor, continuará a existir até o fim deste ano, quando terminará a vigência do código de 1916, cujo artigo 2º diz: “Todo homem é capaz de direitos e obrigações na ordem civil.” (...)
As mudanças que começarão a viger em 1º de janeiro próximo eliminaram expressões impróprias e discriminadoras. Assim, o artigo 1º passará a dizer que “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”. O critério para a capacidade civil é o mesmo para homens e mulheres.(...)
O novo artigo 1565 dirá tudo a respeito da igualdade no casamento. O homem e a mulher serão “consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família”. Nem mesmo substituirá a tradicionalíssima imposição de a mulher adotar o nome de família do marido ou, no máximo, manter o nome de solteira. A contar do ano que vem, qualquer dos noivos, querendo, poderá acrescer o sobrenome do outro ao seu. Seja o dele, seja o dela. (...)
Ceneviva, Walter. “Código Civil amenizará diferenças de sexo”. Folha de S. Paulo, Cad. Cotidiano, seção Letras Jurídicas, 17/08/2002, p. 2.
Atividades
1) Antes de procurar entender o texto, preste atenção à informação que vem imediatamente após ele: quem o escreveu, título, qual é o suporte (livro, revista, jornal, folheto, site, etc.), seção e data de publicação.
a) Qual é o título do texto?
b) O novo Código Civil entrou em vigor em 1º de janeiro de 2003, portanto, o fato já aconteceu. Por que então o verbo do título está no futuro?
c) Em que tipo de suporte o artigo foi publicado?
d) A que área do conhecimento o texto pertence?
e) Qual é o dialeto usado pelo autor? Por que ele é adequado?
2) O texto refere-se à discriminação no Código Civil. De que tipo?
3) Como a linguagem do Código Civil de 1916 exprimia tal preconceito?
4) De 1916 para cá, o modo de entender o papel da mulher na sociedade mudou. Encontre no texto um exemplo de que a língua acompanha a mudança de costumes.
5) Pense na comunidade em que você vive. É difícil, talvez mesmo impossível, existir alguma em que pessoas não façam discriminações de nenhuma espécie. Você sabe que a linguagem “mostra” a discriminação, os preconceitos de quem a usa. Liste as palavras ou expressões da linguagem oral que exprimem os preconceitos existentes na sua comunidade. Participe da conversa que o professor vai propor sobre essa questão.
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